Carlo Ancelotti refuta seleção brasileira com identidade fixa — e isso é uma ótima notícia

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Novo técnico aposta na adaptação ao elenco e recusa a imposição de um modelo único de jogo. Convocação da Seleção: primeira lista de Carlo Ancelotti
Apresentado nesta segunda (26) como novo treinador da seleção brasileira, Carlo Ancelotti posou com a camisa pentacampeã e não perdeu tempo ao anunciar a primeira lista de convocados, que irão defender o Brasil nas próximas partidas das Eliminatórias Sul-Americanas para a Copa do Mundo de 2026, contra Equador (dia 5 de junho, em Guaiaquil) e Paraguai (dia 10, em São Paulo).
Ao ser questionado sobre o estilo de jogo que pretende implementar, o italiano foi categórico: ele simplesmente não sabe.
Depois de 40 anos, eu ainda não sei qual é a estratégia, o sistema que permite ganhar os jogos. Eu ainda não sei. Mas eu sei que o sistema tem que depender das características dos jogadores que você tem para fazer com que o jogador, quando estiver no campo, se sinta confortável. Essa é a ideia que eu quero ter aqui também, aproveitar da enorme qualidade que este país tem com estes jogadores e trabalhar para que toda essa qualidade possa se agrupar com um único objetivo, que é ganhar a Copa do Mundo.
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É uma resposta que chama a atenção e convida à reflexões.
Muitas das críticas aos técnicos anteriores, como Ramon Menezes, Fernando Diniz e Dorival Júnior, apontavam a falta de uma “identidade clara” como razão de insucesso do Brasil. Com Tite, eram muitos os diagnóticos. Entre eles, a falta de encantamento no jeito de jogar e até o sucesos exagerado (?) nas Eliminatórias.
Muito se defendia a ideia de encontrar um estilo brasileiro, ao minimamente um estilo de jogo, como se o sucesso dependesse da fidelidade a uma ideia de “brasilidade”. Como se o Brasil perdesse por ser muiuto europeu e pouco brasileiro – você já ouviu isso muitas vezes.
Ancelotti vê futebol como uma competição orientada pela vitória. É uma forma de pensar diferente de treinadores como Pep Guardiola, Fernando Diniz ou até Xabi Alonso, sucessor do italiano no Real Madrid, que entendem que o jogo tem debates filosóficos e até ideológicos, e que é preciso sempre escolher um lado: dominar ou adversário ou esperar? Ter a posse para controlar e atacar, ou apostar na velocidade?
As primeiras palavras de Carlo Ancelotti como técnico da Seleção Brasileira
Ancelotti não é adepto de nenhum desses debates filosóficos até demais. Calma: o italiano não defende que cada um jogue por si, ou que o time atue sem direção. Nada disso. Ele apenas acredita que não existe uma fórmula universal para vencer. Para ele, a tática deve servir ao jogador, não o contrário.
Propositivo ou reativo? É interessante. Eu acho que, no futebol, não pode se fazer uma única leitura. Tem que ser futebol propositivo em alguns jogos e reativo em outros. Eu não gosto de time que eu treine e tenha uma identidade, significa que você só é capaz de fazer uma coisa. Se quer ter sucesso, precisa fazer muitas coisas bem. Propositivo, reativo, pressionar… Existem muitas coisas para ter sucesso. Por isso, quando me dizem: ‘o seu time não tem uma identidade clara’. Eu não quero identidade clara.
Nosso jeito de olhar para o jogo sempre foi dividido entre a idealização de um estilo romântico, quase inacessível de tão idealizado, e a necessidade desenfreada de competir. Basta ver as romantizações entre perder, como em 1982, e encantar o mundo, ou vencer, como em 1994.
Esse antagonismo é nocivo. Provoca uma cegueira não apenas no torcedor, mas em todos que acompanham o futebol. O Brasil de 1994 sempre foi incompreendido pelo seu modo quase estéril de controlar o jogo. Já o Brasil de Dunga, que muitos reconhecem como um grande time que fracassou apenas na Copa, não queria ter a bola e era mais eficiente justamente nas escapadas de Elano e Robinho. O que pesou, nesse caso, sempre foi o resultado.
Ancelotti pode ser a luz no fim do túnel que o Brasil precisa para abandonar essa ideia prejudicial de que é preciso fazer isso ou aquilo para vencer.
Carlo Ancelotti em apresentação como técnico da seleção brasileira
Reuters
O italiano nunca fez seus times jogarem feio para vencer, mas também nunca colocou o estilo acima da vitória. De todos os treinadores no Brasil e no mundo, ele talvez seja quem melhor representa o equilíbrio que anda tão em falta na era das redes sociais.
Sua prioridade, como indicam as respostas nas coletivas, será construir uma equipe capaz de se ajustar, confortável na diversidade, calma e serena de si como o Brasil não anda sendo nas últimas copas. Sobretudo, preparada para vencer.
Exatamente como fez nos últimos três anos no Real Madrid, como fez em seus muitos títulos e como quer fazer na Copa do Mundo de 2026. Que honra tê-lo por aqui.
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